terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Por que o mundo é verde?

Inspirado em um comentário do Luiz em outro blog, resolvi escrever este post sobre uma das perguntas que por mais de 40 anos instigou os ecólogos. Hairiston (1960), em um trabalho importantíssimo para as bases do estudo de teias tróficas, reuniu os organismos em distintos grupos levando em consideração o modo de alimentação (herbívoros, carnívoros e outros) e no final do final do trabalho levantou a pergunta: Por que o mundo é verde?

O mecanismo seria o seguinte: os carnívoros exercem pressão na população de herbívoros via predação e, assim, liberam os produtores primárias da pressão por pastagem dos herbívoros. Um exemplo clássico de cascata trófica. Algo bem simples, difícil de ser mostrada em ambientes naturais. Porém, Jonh Terborgh (respeitável professor da Universidade de Duke e autor de um dos mais incríveis livros sobre conservação "Requiem for nature", algo como marcha fúnebre para a natureza) publicou um artigo na Science em 2001 com título "Ecological Meltdown in predator-free forest fragments".

Neste artigo, Terborgh e outros pesquisadores puderam observar em tempo real o efeito da ausência de predadores em fragmentos de floresta. Estes fragmentos foram gerados com a construção de uma hidroelétrica na Venezuela. Com a criação do reservatório, foram alagados mais de 4.300 kilômetros quadrados. Devido a natureza irregular desta área, foram formadas ilhas no topo de pequenos morros. Sendo que em algumas dessa ilhas era possível ou não encontrar os famosos predadores de topo (carnívoros).


Ilhas Guri (fragmentos formado pelo reservatório de uma hidroelétrica)


Deste modo, Terborgh pode responder a pergunta feita por Hairston, em 196o, com provas reais. E basicamente o que se viu foi o que Hairston tinha imaginado. Nos fragmentos sem carnívoros, era observado superpopulações de herbívoros. Formigas, iguanas e macacos herbívoros não precisavam mais se preocupar com predadores. Era o céu para eles! Comer e se reproduzir. Tudo na calma. Ao contrário do que muitos pesquisadores pensavam, pois acreditavam que esse crescimento não seria tão grande devido a disponibilidade de alimentos, Terborgh observou um aumento da densidade de herbívoros muito expressivo. Estes animais não se importavam tanto se um dia o suprimento de alimento poderia acabar, eles aumentavam em número absurdamente. Nestes fragmentos, Terborgh também observava que não existia serrapilheira (acúmulo de folhas mortas no solo da floresta), além disso era possível observar o ceú com facilidade (algo extremamente difícil em florestas tropicais, pois o dossel é muito denso), fatos este que tem influência decisiva nos processos biogeoquímicos que ocorrem no solo, além de afetar a dinâmica dos vegetais ali presentes.

Com base nestes fatos, observamos a importância da preservação de todos os componentes teia trófica. Este equilíbrio é muito tênue. Com as taxas de fragmentação dos ambientes naturais cada vez maiores (seja por criação de hidroelétricas, seja por desmatamento), a possibilidade da ocorrência do colapso (ou como disse Terborgh, derretimento) das teias tróficas cresce exponencialmente. O que torna esse fenômeno uns dos mais importante para a Biologia da Conservação. E fica aqui a minha nova pergunta, sabendo porque o mundo é verde, por quanto tempo ele ainda continuará assim? Não estou fazendo essa pergunta com um tom ambientalista, mas me preocupo muito com a fragmenteção de nossa matas. Um exemplo claro é a a Mata Atlântica, reduzida a menos de 10% da sua cobertura original, porém mais grave ainda, é que a mesma se encontra totalmente fragmentada. Isto potencializa ainda mais o desaparecimento deste bioma tão diverso.

Refrências:

Terborgh, J., L. Lopez, P. Nuñez V., M. Rao, G. Shahabuddin, G. Orihuela, M. Riveros, R. Ascanio, G. H. Adler, T. D. Lambert and L. Balbas. 2001. Ecological Meltdown in predator-free forest fragments. Science 294: 1923-1926.

Hairston, N.G.; Smith, F.E. and Slobodkin, L.B. 1960. Community structure, population control and competition. American Naturalist 94: 421-425

6 comentários:

  1. Gosto do blog de vocês, pois trata ecologia do jeito que merece, do jeito sério.
    Uma outra coisa que ajuda a explicar o porque do mundo ser verde é o fato das plantas não serem passíveis no ambiente, através dos seus inúmeros mecanismos de se defenderem, diretos (estratégias morfológicas, anatômicas e fisiológicas...)ou indiretos (cairomônios...). E além de suas defesas existem também as inúmeras adaptações para suas sobrevivências em ambientes dos mais diversos, de aquisição de nutrientes e água, até os complexos mecanismos de reprodução.
    Juntando tudo isso fica mais fácil compreender porque o mundo é verde!
    Abraços

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  2. Caro Marcus,

    obrigado pelo elogio. Com certeza, esse é o objetivo meu e do Luiz. Acredito realmente que as características que você falou são importantes, porém o que regula mesmo é a pressão de herbivoria. Tudo o que vc falou é ou será contornado por adaptações do herbívoros. Essa corrida é infindável.
    Parabéns pelo blog, gosto muito de orqídeas também. Tenho duas aqui em casa.
    Abraços

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  3. Obrigado pelo elogio também Breno.
    Ainda não me convenci quanto ao que seria a causa e a que caberia o título de efeito, pois ao mesmo tempo em que a herbivoria exerce pressão sobre as plantas, as adaptações das plantas exercem também pressão sobre os herbívoros, e assim seguem os seres nessa brincadeira de driblarem uns aos outros...
    E afinal, o mundo já era verde antes dos insetos, vide Carbonífero, um período em que o planeta era pobre em diversidade e em quantidade de insetos para atuarem nos primeiros estágios da decomposição dos resíduos vegetais, por isso o planeta acumulou muito carbono no solo daquela época, ou seja, devido a degradação parcial da matéria orgânica...
    Além disso tem ainda as estratégias das plantas adquirirem recursos, como nutrientes de solos paupérrimos, além de utilizarem de maneira eficiente esses recursos limitados, vide Cerrado.
    Essa discussão vai longe, lembro de uma aula de entomologia em essa discussão lançada pelo professor durou 2 h seguidas, e terminou sem uma conclusão que agradasse a todos.

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  4. Caro Marcus,

    realmente em era geológicas passadas (sobre as quais entendo muito pouco) onde não existiam ainda insetos, não questiono o porquê do mundo ser verde. É inegável. Porém essa pergunta só faz sentindo com a interação entre as plantas e dos organismos que delas se alimentam. Tb não discuto as várias adaptações que as plantas tem para os mais diefrentes ambientes. Mas com certeza, por mais inóspito que seja o ambiente, a herbivoria é um fator de grande (ou maior, quem sabe) importância. Na restinga por exemplo, por mais que a temperatura chegue a 50 graus tranquilamente, existem insetos herbívoros e as adaptações das plantas para reter água são como um molho especial para esses aniamais (é através delas que conseguem água). Assim, independemente do lugar onde a planta esteja existirá a força (forte, no meu entendimento) da predação na regulação da biomassa vegetal.
    Isto é o que acho, mas não sou nenhum especialista nesse assunto. Se tiver algum lendo estes comentários (tipo a Milena....rs) se souber de algo mais concreto será muito bem vindo.
    Abraços

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  5. Ops...

    onde se lê "da predação na regulação...."

    lê-se "da HERBIVORIA na regulação..."

    Desculpe a falha...

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  6. Concordo com os dois. Mas, como o breno, acho o papel da regulação dos herbívoros pelos predadores um fator mais forte na teia. Vide o experimento citado no post pelo breno. Se as adaptações e defesas das plantas contra os herbívoros fossem mais expressivas do que o fator predação, as ilhas onde os carnívoros foram extintos ainda teria vegetais para contar história. E isso não aconteceu.

    Quanto a restinga, ao mesmo tempo que as plantas retêm água, elas também reforçam a sua característica coreácea, dificultando tanto a alimentação quanto a digestão desta matéria orgânica pelos herbívoros. Mas é claro que ao longo de milhões de anos foram selecionados animais que convivem perfeitamente com essa condição "desfavorável".

    Na verdade, "desfavorável" muito entre aspas, pois como diz o Prof. Ricardo Iglesias, a restinga não é um ambiente desfavorável. Só se for para o Homo Sapiens. Para os animais que estão ali há milhões de anos e estão adaptados a esta condição, o ambiente não é desfavorável. Pelo contrário, pode ser favorável se pensarmos que elimina competidores que lotam as florestas tropicais.

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