sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Uma bactéria que vale por um ecossistema inteiro

Em um trabalho publicado na última edição da revista Science, pesquisadores americanos ao analisarem amostras de fluidos provenientes de fendas na crosta com mais de 2,5Km de profunidade descobriram que estas continham basicamente uma única espécie de bactéria (representava >99% dos organismos encontrados). Esta é capaz de fixar seu próprio nitrogênio e carbono, além de ser termofílica quimioautotrófica e redutora de sulfato. Este ambiente apresentava temperatura de aproximadamente 60°C e pH 9,3, além disso estava exposto a altíssimas pressões e a uma severa limitação de nutrientes.

O genoma desta bactéria (Desulforudis audaxviator) possui genes capazes de produzir proteínas que participam da redução dissimilatória de sulfato. Além disso, a assimilação de carbono desta bactéria pode ter várias origens, pois seu genoma apresenta genes para transportadores de açúcares e aminoácidos. Analisando as condições do ambiente, acredita-se que o carbono fixado provem de fontes inorgânicas.


Maquinaria metabólica da Desulforudis audaxviator. Fonte: Science


Deste modo, esta fenda apresenta a mais simples comunidade microbiana encontrada na natureza (quase que exclusivamente uma espécie). A habilidade desta bactéria reduzir sulfato garante a ela acesso ao aceptor de elétrons mais energeticamente favorável. Isto nos mostra que esta bactéria é capaz de atuar em todos os papéis para um modo de vida independente, codificando a partir do seu genoma todos os componentes biológicos de um ecossistema simples, possibilitando total independência da fotosfera.

O mundo microbiano sempre me surpreende, agora nos mostra que um organismo que realiza funções ambientais equivalentes a vários outros organismos separados. Isso me lembra quando eu descobri que nós temos mais células microbianas do que nossas próprias células constituindo nossos corpos. Realmente, com todas essa novas técnicas moleculares sendo inventadas a cada dia, um novo mundo dominado por microorganismos surge a nossa frente.

Movimento internacional contra a energia eólica

Manifestação que reuniu quase 3 mil pessoas em Paris contra a política de energia eólica. Fonte: Coletivo 4 outrubro


Um dos principais argumentos dos ambientalistas é de que a mudança do comportamento de cada um (contestado pelo blog em outro post) e a utilização de fontes de energia consideradas "limpas" são a salvação do mundo perante o desastre do aquecimento global. O fato é que cada vez mais vemos que algumas iniciativas deveriam ser tomadas com cuidado e não de forma precipitada. Às vezes uma medida que poderia ser considerada "verde" ou "ecológica" acaba tendo resultados muitas vezes catastróficos. Isto é o que grupos franceses e de vários outros países do mundo estão defendendo no caso da energia eólica.

No último dia 4 de outubro uma manifestação reuniu quase 3 mil pessoas em Paris contra a política de utilização em larga escala da energia eólica, que vem sendo realizada em vários países europeus. Este grupo de pessoas formaram o Coletivo 4 de outubro contra a indústria eólica, nome dado devido ao primeiro protesto, que ocorreu na mesma data no ano de 2007.

Um dos principais argumentos levantados pelo movimento seria de que os lugares onde estão sendo implantados os aerogeradores não apresentam ventos constantes, fazendo com que sejam necessários centros produtores de energia reserva. Estes centros normalmente utilizam óleo ou carvão como fonte de energia, trazendo resultados, em termos de emissão de carbono, não tão positivos como os divulgados pela mídia. Além disso, problemas ligados ao grande investimento feito com dinheiro público sem consulta à população, alterações das paisagens, desvalorização dos imóveis e até problemas ecológicos (também já discutidos aqui no blog em outro post). Em uma carta oficial assinada por várias associações européias ligadas a este movimento, as demandas feitas por eles seriam a suspenção imediata de todos os projetos ligados a fazendas de energia eólica, para que estes sejam discutidos por orgãos independentes.

Como levantado por Rui Moura, não podemos desprezar a energia eólica. Isto também é verdade para outros tipos de energia como a solar e as que utilizam a maré. Mas estas alternativas devem ser encaradas como complementares e não como projetos independentes. A matriz energética de um país forte deve ser a mais diversificada possível por motivos estratégicos. Por motivos ecológicos esta diversificação deve privilegiar fontes de energia menos impactantes ao meio, o que nem sempre significa privilégio apenas às consideradas "limpas" ou "renováveis". Para utilizar apenas este tipo de fonte de energia é necessário uma área muito grande (muitas vezes inviável) e também "fontes reservas" em ocasiões onde não há sol ou vento. Como mostrado em um cartoon francês abaixo, antes eles tinham só energia atômica. Agora, energia atômica e um complemento (muitas vezes não significativo) de eólica. Pelo menos agora eles podem ser chamados de "verdes"...



"Antes e depois. Vejam a diferença!"


No caso do Brasil, políticas de contrução de reservatórios com melhor relação área alagada/ energia gerada, o aumento da eficiência de hidrelétricas mais antigas e a não repetição de casos lastimáveis como Balbina podem ser muito mais relevantes, tanto ecologicamente quanto estrategicamente, para o nosso país do que um investimento sem estudos prévios em "energias limpas"

Conheci o movimento lendo o blog português Mitos Climáticos, crítico ferrenho do movimento ambientalista.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Fotografia Científica: Arara Azul

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Bem, continuando a série de fotografia científicas, eis uma de minha autoria. Como vocês podem ver, não sou nenhum fotógrafo profissional, porém esta fotografia tem um significado muito especial para mim. Sempre fui um amante de pássaros. Quando decidi fazer Ciências Biológicas, a primeira coisa que me veio a mente foi a ornitologia. Mas devido a escolhas diversas, não segui esse caminho.

Essa foto foi tirada na fazendo da Embrapa (Nhumirim, MS). Essa fazenda se localiza bem isolada, dentro do Pantanal. Estávamos em uma coleta para o laboratório no qual fiz minha dissertação (e continuo trabalhando).

Podemos observar uma família de araras-azuis da espécie Anodorhynchus hyacinthinus (Ordem Psittaciformes e família Psittacidae). Anodorhynchus se refere a maxila sem entalhes e hyacinthinus se refere a sua cor predominantemente azul. Essas aves formam casais que passam a maior parte do tempo juntos e são bastante fiéis. Além disso, fazem seus ninhos dentro de cavidades de troncos de árvores, podendo botar de 1 a 3 ovos por ninhada. E o período de incubação é de 28 a 30 dias.
Ao entardecer, enquanto estava na sede da fazendo, era possível ouvir as araras chegando. Ao ouvir o som delas, corri para fora da sede e comecei a acompanhar o casal com seu filhote. Eles se alimentavam de sementes de palmeiras, hábito bastante comum desta espécie, pois possuem bastante força no bico e quebram estas sementes com grande facilidade.

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As araras-azuis estão em grave risco de extinção, como várias outras epécies de araras. O tráfico de animais silvestres é uma grande ameça, entretanto a distruição do seu habitat também é um fator de grande importância para a preservação desta espécie. Com o avanço das pastagens para dentro do pantanal, o habitat destes aves se encontra em grande perigo.


Mais informações sobre as araras-azuis: Projeto Arara-Azul

Para enviar fotografias científicas para serem publicadas no blog: discutindoecologia@gmail.com

Para ver mais fotografias científicas, clique aqui.

As cidades não são as únicas culpadas pelo aquecimento global


Foto: Mugley


Enquanto a mídia (e, por conseqüência, ambientalistas) do mundo inteiro culpam as cidades pelo aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera terrestre, o que acontece na chamada "zona rural" acaba não levando tanto crédito. Em um estudo publicado no periódico científico Environment and Urbanization, David Satterthwaite nos mostra que a contribuição das cidades para o aquecimento global pode estar sendo muito superestimada. Ele fez um levantamento de dados utilizados pelo IPCC (Painel internacional sobre mudanças climáticas) e viu que a contribuição das cidades para o aumento da emissão de gases estufa está em torno de 30 a 40 % do total, bem diferente das estimativas anteriores, que chegavam a 80 %.

Ainda segundo o estudo, os principais fatores que contrubuem com esta discrepância nas estimativas está relacionado a emissão de gases estufa pela agricultura (tanto de metano em riziculturas quanto de óxido nitroso devido ao uso abusivo de fertilizantes) e por indústrias de grande porte que queimam combustíveis fósseis e normalmente se localizam fora das cidades.

A grande discussão está realmente na definição de cidade. O autor tenta dissociar as grandes indústrias das cidades através do argumento de que não podemos culpar as cidades por esta emissão, mas sim os indivíduos e as instituições que geram esta emissão. Dois terços da população mundial vive em cidades consideradas pequenas e, desta forma, contribuem muito menos do que as considaradas metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro.

É claro que a emissão de carbono por queima de combustíveis fósseis é relevante na maioria das cidades, mas em termos globais esta contrubuição não chega a 57 %. A idéia de que só a mudança de hábito das pessoas nas grandes cidades pode diminuir de forma significativa o aquecimento global é uma falácia. Enquanto a demanda por alimentos continuar a crescer e ainda acharmos que nossa grande carta na manga é a utilização em massa de biocombustíveis baseados em plantas terrestres, a chance do cenário mais pessimista do IPCC prevalescer é quase uma realidade.

Vi no NewScientist

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Buraco na camada de ozônio aumentou 2 milhões de quilômetros quadrados em 2008

Buraco na camada de ozônio em 7/10/08. Créditos: KNMI/ESA

O ozônio (O3) é um constituinte natural da atmosfera terrestre e na estratosfera forma uma camada que evita a entrada de altos níveis de radiação ultravioleta, funcionando como um escudo. Gases originados pelo produto antrópico CFC (clorofluorcarbono) acabam reagindo com o ozônio, destruindo parte desta proteção natural. Mesmo sendo proibidos deste 1987, uma fração destes gases ainda se encontram na atmosfera.

Uma parte do meio acadêmico defendia que a camada de ozônio estava em plena recuperação devido aos números positivos dos últimos anos, culminando com a diminuição do buraco em 4 milhões de quilômetros quadrados entre os anos de 2006 e 2007. Mas as medidas realizadas este ano mostram que o processo não é tão simples. O aumento registrado pela Agência Espacial Européia é de 2 milhões de quilômetros quadrados, chegando ao total de 27 milhões, próximo ao registrado em 2006. Mas calma ambientalistas, o mundo não está perdido.

O aumento ou diminuição da camada de ozônio depende muito de fatores meteriológicos regionais, fazendo com que esta sofra uma forte variação interanual. Isto quer dizer que apenas com mais estudos de longa duração poderemos ver se há realmente uma recuperação ou deteriorização da camada. A situação mais preocupante neste caso é que os principais fatores que influenciam tanto o tamanho do buraco quanto a espessura da camada de ozônio são a temperatura e a dinâmica atmosférica. Desta forma, alterações na atmosfera terrestre decorrentes do aquecimento global podem causar grandes diferenças na camada de ozônio, sendo portanto de extrema importância um monitoramento contínuo destes fatores.

Como grande parte das coisas em ecologia, tanto a falta como o excesso pode ser tornar um problema. Um estudo da Royal Society, a agência nacional de ciências britânica, mostra que houve um aumento de aproximadamente 2 p.p.b. (partes por bilhão) por década desde 1980 das concentrações de O3 no nível do solo, chegando a valores muito perigosos de 35-40 p.p.b. na maior parte das cidades industrializadas do mundo. Ao nível do solo, o ozônio é um forte poluente, sendo prejudicial tanto a nossa saúde (causando vários problemas respiratórios) quanto para a vegetação. Sua ação em plantas é devido ao seu forte poder oxidante, o que pode causar a necrose de tecidos internos das folhas após a passagem pelos estômatos. Este impacto normalmente ocorre quando as concentrações de ozônio chegam a 40 p.p.b. As principais fontes antropogênicas dos percussores de ozônio na troposfera são escapamento de veículos, indústrias e solventes químicos.

O estudo diz que o prejuízo em plantações da União Européia foi estimado em U$ 9 bilhões, devido a este problema. Se todas todas as legislações atuais forem respeitadas, as previsões são de que as concentrações de ozônio até 2050 devem sofrer uam queda de 15 p.p.b. Mas tal queda não é esperada para países em desenvolvimento, onde o aumento pode chegar a 3 p.p.b. até mesmo ano.

Alguma proposta de transferência do ozônio da troposfera para a estratosfera, salvando assim o nosso planeta do colapso? Talvez será o próximo trabalho do Lovelock ...

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Parasitas: a forma de vida mais bem sucedida do planeta

Parace uma afirmação estranha, mas para vários cientistas esta é uma realidade. Em um artigo para a revista Conservation Magazine, o escritor e blogueiro americano Carl Zimmer discorre sobre como este assunto já foi e ainda é muito controverso no meio acadêmico.





Uma cadeia trófica (alimentar) tradicional é formada por decompositores, produtores primários e consumidores. Dentro dos consumidores temos vários níveis (dependendo do tamanho da cadeia), culminando no chamado predador de topo. Este nível trófico é considerado classicamente como o último nível da cadeia trófica, onde os organismos apenas predam e não são predados. Temos como exemplo tradicional deste nível o grande predador africano, o leão.

Parasitas (vírus, bactérias, protozoários, fungos e animais) são organismos muito pequenos mas que podem ter uma importância muito maior da figura tradicional feita por ecólogos de cadeias e teias tróficas. O nosso clássico predador de topo da áfrica pode apresentar mais de 30 espécies de vermes parasitas em seu corpo, além de outras mais de bactérias, vírus e protozoários. Outros estudos mostram que a biomassa destes parasitas pode ultrapassar a biomassa de predadores em alguns ecossistemas, chegando até a ser 20 vezes maior.

Com toda esta importância ecológica, a incorporação destes organismos em modelos de teias tróficas pode alterar de uma vez por todas a péssima imagem que os parasitas têm para nós humanos. Eles, além de poder controlar a relação entre a população de predadores e presas em um determinado ecossistema, por serem relativamente frágeis podem se tornar ótimos indicadores ambientais. A baixa biomassa ou inexistência de parasitas em um ambiente pode indicar que este encontra-se em estágio avançado de degradação. Eles são considerados organismos bioindicadores.

Dentre os parasitas citados por Carl Zimmer neste artigo, os que mais me intrigam são os personagens quase invisíveis, vírus e bactérias. Tenham certeza que estes serão personagens recorrentes deste blog.